CPI da Covid aprova quebras de sigilo que miram Ricardo Barros e de advogado da família Bolsonaro

 BRASÍLIA - A CPI da Covid aprovou nesta quinta-feira 187 requerimentos, inclusive algumas dezenas de quebras de sigilo que miram o líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR). Outro alvo é Frederick Wassef, advogado da família Bolsonaro. Integrantes da comissão suspeitam da ligação de Barros com irregularidades na negociação da vacina Covaxin. Esse imunizante, desenvolvido pelo laboratório indiano Bharat Biotech, foi o mais caro a ter negócio fechado com o Ministério da Saúde. As tratativas no Brasil ficaram a cargo da empresa Precisa, mas elas foram suspensas pelo Ministério da Saúde após o caso ter entrado no radar da CPI.

Na reta final da CPI, que deve acabar no próximo mês, os parlamentares aprovaram o que deve ser a última leva de convocações e pedidos de documentos. Por acordo, o nome do ministro da Defesa, Walter Braga Netto, ficou de fora da lista. Ele coordenou as ações de enfrentamento à Covid-19 enquanto esteve no comando do Ministério da Casa Civil, mas, por atualmente comandar as Forças Armadas, parlamentares quiseram evitar um embate direto com os militares

A CPI já tinha determinado a quebra do sigilo fiscal de Barros a partir de 2018. Agora, estendeu esse período até 2016, o que vai abranger todo o tempo em que ele foi ministro da Saúde durante o governo do ex-presidente Michel Temer. Barros responde a um processo de improbidade administrativa na Justiça Federal em razão de um contrato fechado pela pasta nessa época com a empresa Global, sócia da Precisa, que recebeu pagamento adiantado, mas não forneceu os medicamentos que deveria.

Após a votação, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), fez um apelo para que o sigilo não fosse estendido, mas não houve deliberação.

— Eu acho que Vossa Excelência [senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da CPI] poderia ou fazer um apelo à comissão para deconsiderar essa decisão ou reduzir o alcance, o prazo.

A CPI também vai solicitar ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Tribunal de Contas da União (TCU) informações sobre processos envolvendo Ricardo Barros. Além disso, a pedido de relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), foi aprovado a quebra do sigilo fiscal de 20 empresas. Segundo Renan, os depoimentos, informações e documentos em posse da comissão "demonstram estar inter-relacionados comportamentos, transferências monetárias e ligações societárias entre o deputado Ricardo Barros" e essas empresas.

A Precisa e o dono dela, o empresário Francisco Maximiano, também tiveram o prazo de quebra de sigilo fiscal ampliado.

Além disso, a CPI aprovou a quebra dos sigilos telefônico, fiscal, bancário e telemático da Global. Outros personagens envolvidos em negociações suspeitas de vacinas, como a entidade privada Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah) e o o coronel Marcelo Bento Pires, que já teve cargo no Ministério da Saúde, também tiveram sigilos quebrados.

Foram solicitadas ainda informações ao Ministério da Saúde sobre alguns temas, como o desenvolvimento do aplicativo TrateCov, que receitava cloroquina até mesmo para gestantes e bebês, e detalhes da exoneração de Roberto Ferreiras Dias do Departamento de Logística da pasta. Roberto foi acusado de pressionar a pela liberação da Covaxin e de cobrar propina na negociação de outra vacina.

A CPI também pediu informações ao Ministério das Relações Exteriores sobre contatos com a Precisa e a Bharat Biotech.

A CPI também convocou algumas pessoas: Roberto Pereira Ramos Junior, presidente do Fib Bank; Luiz Henrique Lourenço Formiga, diretor do mesmo banco; o lobista Marconny Nunes Ribeiro Albernaz de Faria; Jaime José Tomaselli, executivo da World Brands; Emanuel Catori, sócio da Belcher Farmacêutica; e José Ricardo Santana. Outro requerimento aprovado, de Humberto Costa, é para a Polícia Federal prestar informações sobre inquérito instaurado contra o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e o empresário Airton Antônio Soligo, que foi seu assessor.

A CPI aprovou ainda a quebra do sigilo fiscal de Frederick Wassef, advogado da família Bolsonaro. Segundo o requerimento de Renan, "foram interrelacionados comportamentos, transferências monetárias e ligações societárias" entre diversas empresas e investigadas e pessoas, entre elas Wassef. Também foi aprovado requerimento pedindo ao Senado é Câmara dos Deputados de "todos os registros de acesso e entrada" de várias pessoas, como Wassef e Maximiano.

A votação dos requerimentos foi em bloco. Uma parte deles, para quebrar o sigilo de blogueiros e perfis das redes sociais, foi votada à parte a pedido do senador governista Eduardo Girão (Podemos-CE). A base do governo apelou para a liberdade de expressão para que a medida não fosse adotada. Já a oposição alegou que eles faziam ataques à democracia e promoviam desinformação. Assim, a CPI aprovou a quebra de sigilo. Entre os alvos está o blogueiro bolsonarista Allan Lopes dos Santos, que já foi alvo do STF e da Polícia Federal (PF).

— Se houve algum excesso desses personagens, que seja devidamente investigados dentro dos procedimentos e ritos legais. Obviamente receber dinheiro ou qualquer outro benefício para disseminar fake news é inaceitável e deve ser punido com os rigores da lei. Porém, isso é diferente da imposição de medidas ilegais e invasivas. Quero fazer um apelo, porque nós já estamos vendo uma verdadeira caçada de tribunais superiores. O TSE está demonetizando sites, blogs que simplesmente fazem um contraponto, têm ideias divergentes. Isso é muito perigoso. Começa com site, com blog, daqui a pouco vai para a imprensa. É uma liberdade, um fundamento constitucional — disse Girão.

Uma coisa é falar em democracia, livre expressão. Outra são esses sites, e estamos atrás de quem financia esse tipo de coisa para cortar o mal pela raiz, que pede para invadir o Supremo, o Senado. É a gente ouvir aqui um cidadão, um oficial da reserva do Exército que é dono de um site, vir aqui e no site ele ser negacionista, defender o tratamento precoce, mas pela calada da noite, às escondidas, como se estivesse fazendo uma coisa muito errada, negocia vacina. Não estamos perseguindo ninguém da imprensa. Nem queremos isso. O senhor não vê nenhum jornal, televisão brasileira hoje defender invadir o Supremo Tribunal Federal. O senhor não vê alguém pedir para invadir o Congresso Nacional. Esses sites são financiados por alguém, e por alguém que não quer a democracia, fora a quantidade de vidas que se perderam por eles mentirem — rebateu Omar Aziz.

A CPI também aprovou um pedido para o STF compartilhar materiais dos inquéritos que apuram ataques à Corte e atos antidemocráticos, desde que "possuam pertinência com desinformação no contexto da pandemia da Covid-19".

Outro alvo de requerimentos nesta quinta-feira foi a  gestão dos hospitais federais localizados no Rio de Janeiro. Foram pedidas informações ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) em relação a gestores e ex-gestores. Também foram aprovados requerimentos do senador Humberto Costa (PT-PE) para que esses hospitais repassem algumas informações.

O Globo

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