Diplomacia do governo Bolsonaro emperra relação com China e Índia

 Foto: (Marcos Corrêa/Presidência da República)

Neste momento, o Brasil depende da Índia para receber vacinas, e depende da China para receber matéria-prima de vacinas. Não é uma situação confortável por causa dos rumos que o governo Bolsonaro deu à nossa diplomacia. O presidente e seu ministro das Relações Exteriores minaram as relações com esses países e ainda apostaram tudo em um alinhamento com Donald Trump.

Em outubro do ano passado, na formatura de novos diplomatas, no Itamaraty, o chefe da diplomacia brasileira, Ernesto Araújo, incentivou os formandos a romper o que chamou de "barreira da mediocridade", ao se referir à diplomacia tradicional. Defendeu o alinhamento do governo Bolsonaro com o do então presidente americano Donald Trump e declarou que não se importava em o Brasil se tornar um pária do mundo.

“É bom ser pária. E este pária aqui, este Brasil, esta política externa do povo brasileiro, esta política externa ‘severina’, digamos assim, tem conseguido resultados”, disse Ernesto Araújo na ocasião.

Estado pária é aquele que age fora das regras de relações internacionais. E a política externa de Bolsonaro e Ernesto Araújo segue um caminho que pode mesmo levar a esse distanciamento de antigos aliados.

Um exemplo é a posição brasileira em relação ao pedido da Índia sobre a suspensão das patentes vinculadas ao combate à pandemia. E, agora, dependemos exatamente do governo da Índia para a entrega de um lote de vacinas.

E o Brasil precisa muito de outro importante parceiro do grupo conhecido como Brics: a China, de onde vem a matéria-prima indispensável para as vacinas do Instituto Butantan e da Fiocruz.

Difícil é achar interlocutor que tenha canal aberto com autoridades de lá, porque foram muitos os ataques do presidente Bolsonaro, de seus filhos e ministros aos chineses, inclusive do próprio Ernesto Araújo. Foram ofensas e deboches em declarações públicas e nas redes sociais. E grande parte dos ataques teve relação com a pandemia.

O presidente Jair Bolsonaro chegou a criticar, em entrevista, a vacina produzida na China. Ele disse: "A da China, lamentavelmente, já existe um descrédito muito grande por parte da população. Até porque, como dizem, esse vírus teria nascido lá".

Em diversas ocasiões, a embaixada da China no Brasil repudiou as declarações do governo Bolsonaro e disse que elas poderiam perturbar a normalidade da parceria entre os países. Nos bastidores, o que se fala é que os efeitos desse comportamento começam a ser sentidos agora.

Nesta quarta-feira (20), em reunião com deputados da Comissão de Combate à Covid, Ernesto Araújo negou uma crise com a China em relação às vacinas: "Não identificamos nenhum problema de natureza política em relação ao fornecimento desses insumos provenientes da China. Nossa análise - das pessoas que me precederam aqui - é de que realmente há uma demanda muito grande por esses insumos. Não há nenhum problema político na relação com a China. Queria reiterar: nós temos uma relação madura, construtiva, muito correta, tranquila com a China. Nós vemos isso refletido de várias maneiras. Acho que é importante ver o que é concreto na relação”.

Outra opção arriscada do presidente Bolsonaro e Ernesto Araújo na diplomacia foi o alinhamento incondicional a Donald Trump, que não conseguiu se reeleger e entrou para a história americana como o primeiro presidente, em 150 anos, a deixar o posto sem participar da transmissão de cargo ao sucessor.

O presidente brasileiro e seu chefe da diplomacia foram além. Hostilizaram o adversário eleitoral de Trump, Joe Biden, que acaba de assumir a presidência dos Estados Unidos.

Em entrevista a Julia Dualibi, na GloboNews, o embaixador do Brasil em Washington, Nestor Forster, disse que a relação Brasil-Estados Unidos é antiga e será aprofundada, e minimizou a demora do presidente Jair Bolsonaro em reconhecer a vitória de Biden.

"Eu acho que isso foi um pouco exagerado, sobretudo na imprensa brasileira, Julia, francamente. Assim, ninguém fica contando isso. A decisão do momento de cumprimentar é uma decisão que cabe ao presidente da república. A decisão é dele e ele achou que era melhor esperar assentar a poeira, ter a definição lá do colégio eleitoral no dia 14 de dezembro".

O conselheiro emérito do Centro Brasileiro de Relações Internacionais, embaixador Marcos Azambuja, diz que a política externa do governo Bolsonaro é um desastre e que pode representar um preço alto, especialmente em tempos de pandemia.

"O Brasil ao ter com a China um distanciamento gratuito, desnecessário, com um grande sócio e parceiro, e com a Índia, por problemas que surgiram na Organização Mundial do Comércio, o Brasil, de certa maneira, está se privando do fornecimento eficaz, rápido, amistoso, de componentes que são essenciais para a salvação de vidas humanas no país. Não se trata mais de um erro de julgamento, mas de uma coisa quantificável. Brasileiros irão morrer porque o Brasil tomou certas atitudes que foram contraproducentes e prejudiciais ao seu interesse. Portanto, a politica externa que nós temos seguido é ruim, está errada e tem que ser corrigida", afirma.

G1

 

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